O Nordeste de Amaralina (complexo populacional com 2.040 m² e que engloba o Vale das Pedrinhas, Chapada do Rio Vermelho e Santa Cruz, com 100 mil habitantes) vive o paradoxo de abrigar um povo guerreiro e com forte apelo artístico-cultural, mas vítima da ausência do poder público – com políticas sociais ineficazes e ineficientes. Neste quadro, agrava-se o problema do crime organizado na região.
Passam os anos, e o complexo enfrenta dura realidade: moradores acuados por bandidos armados, que andam pelas ruas matando rivais e demonstram poder para manter espaço no tráfico de drogas. Os criminosos já expulsaram a polícia comunitária da região (dois dos três módulos foram fechados), e, segundo líderes comunitários e comerciantes, um traficante conhecido como Beto Babão, que recentemente teria deixado a prisão, reestruturou o tráfico como crime organizado, após as baixas da disputa entre gangues dos traficantes Eberson Santos, o Piti (morto) e Genilson Lino da Silva, o Perna (recluso na Penitenciária de Catanduva, de segurança máxima, no Paraná).
Segundo relatos a A TARDE, traficantes vêm ameaçando mobilizadores sociais e dificultando ações de resgate da cidadania. Como o projeto Oi Kabum! Salvador, parceria da ONG Cipó – Comunicação Interativa com o Instituto Oi Futuro, que deixou o bairro. Não foi o único motivo, porque já havia um estudo da ONG e do apoiador para mudarmos para o Centro Histórico, mas não podemos negar que o problema existe, relata a coordenadora do projeto, Isabel Gouvêa.
Resta à comunidade de bem, 99% dos moradores, como diz a delegada Jussara Souza (titular da 28ª CP), o estigma de morar em área discriminada, inclusive pelo mercado de trabalho, que estaria sonegando vagas a quem declara ali residir. Empresas de entrega em domicílio recusam pedidos à noite, assim como taxistas, que dispensam clientes.
Rede social – Sem a presença do Estado onde o bairro mais precisa, as localidades estão à mercê das gangues, que, ao sofrer baixas, precisam ser renovadas. Recrutam adolescentes não assistidos pelo governo, prefeitura e famílias, denuncia a diretora do Colégio Santo André (Vale das Pedrinhas), Clarice Pereira dos Santos. Nascida no bairro, professora há 25 anos, ela aponta que é absurda esta falta de atenção. Vale das Pedrinhas e Santa Cruz não têm sequer colégio de ensino médio.
E não falta só colégio. Não temos posto dos Correios, pois alegam que, se abrir, vai ser assaltado, nem Cesta do Povo, sequer campo de futebol ou ginásio de esporte com estrutura decente, acrescenta o padre Renato Filho, há um ano na Paróquia de Santo André. Ele vem tentando construir uma capela na comunidade Nova República (atrás do Parque da Cidade). A Cesta do Povo mais próxima fica fora do bairro, ao lado do Hospital Aliança.
Como a professora e o padre, Gil de Leon, líder comunitário da Chapada, adverte: A Oi Kabum, criada com o Viva Nordeste, foi fechada, entrou em recesso quando um aluno de lá foi morto, ano passado. Não reabriu. Perdemos o Balcão de Justiça e Cidadania, que a Faculdade Ruy Barbosa mantinha, e nunca vi uma viatura da tal ronda escolar.
Sem lazer – Um comerciante de 53 anos diz que o lazer se resumiu a jogar dominó em casa: Gosto de certo bar, mas não o frequento mais por causa do risco, na troca de tiros entre bandidos ou quando a polícia chega. Segundo ele, a ausência de PMs da companhia do bairro (40ª CIPM) nas ruas – que saberiam diferenciar moradores de bandidos – faz com que solicitações (via 190) sejam atendidas pela Rondesp ou Choque: Apontam fuzis para todos e agridem. Quem foi humilhado anteriormente corre ao ver viaturas e pode ser morto, pois ao correr se torna suspeito.
Teria sido assim a morte do porteiro Gilson Barreto, 29, em 17 de outubro. Ao sair de uma festa com amigos, Gilson teria sofrido abordagem de PMs e correu. Em frente do módulo, no Areal, foi morto com oito tiros, de dentro do módulo. Policiais foram avisados pelo rádio, contou o comerciante Agnaldo Santos. Gilson Barreto não tinha ficha criminal nem foi provado que cometia crimes, como acusou a Polícia Militar. Em resposta, parte da comunidade incendiou o módulo, que acabou desativado. Eu mesmo perdi meu filho, Thiago, de 18 anos, em de maio de 2008, morto por PMs lamenta Agnaldo.
Colaborou Luiz Lasserre
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