Pode custar R$ 27 bilhões a
nova bondade proposta pelo presidente Jair Bolsonaro, o corte de tributos
cobrados sobre a gasolina. Dedicado em tempo integral à caça de votos, ele
conduz a mais cara campanha eleitoral deste ano, provavelmente a mais cara da história
brasileira. Empresas são proibidas de financiar candidaturas, mas limitações
desse tipo são dificilmente aplicáveis ao Tesouro público. Parlamentares
destinaram R$ 4,9 bilhões ao Fundo Eleitoral, multiplicando por 2,5 o valor
aprovado para as últimas eleições. Pode ter sido escandalosa, mas foi uma
decisão legal. Ações eleitoreiras de interesse do presidente podem ser ainda
mais custosas, tanto pelos efeitos fiscais quanto pelas consequências
econômicas mais difusas.
Populismo, irresponsabilidade e imediatismo têm marcado as ações
do presidente Bolsonaro e da maior parte dos congressistas, no esforço de
sedução de eleitores. Atacar a Petrobras, numa encenação de cuidado com os
consumidores, tem sido quase um ritual obrigatório. Depois de manter preços
inalterados por 57 dias, a estatal anunciou grandes aumentos, na semana
passada, quando os efeitos econômicos da invasão da Ucrânia já atingiam as
cotações internacionais do petróleo e de alimentos.
A decisão, normalíssima na atividade empresarial, criou o
cenário para novas manifestações populistas. Segundo o presidente da República,
faltou sensibilidade aos dirigentes da Petrobras. O presidente do Senado,
Rodrigo Pacheco, aproveitou a ocasião para se mostrar preocupado com os
consumidores, também qualificáveis, nessas ocasiões, como eleitores. O senador
cobrou “responsabilidade social” da empresa e criticou seus lucros. A
Petrobras, segundo ele, tem tido o triplo da lucratividade das concorrentes e
tem distribuído dividendos bilionários. “Óbvio que é muito bom que isso aconteça, mas não pode acontecer
em prejuízo da população brasileira que abastece seus veículos ou que precisa
de transporte coletivo”, disse o senador, numa divertida tentativa de
equilibrismo.
Ele teria dado uma contribuição mais notável se houvesse
explicado o tal “papel social” da Petrobras e os limites desejáveis de sua
lucratividade. Poderia, talvez, ter ajudado a entender as condições da correta
administração de uma empresa de capital aberto com as características da maior
companhia brasileira do setor de petróleo.
O maior acionista da Petrobras é o Estado brasileiro, mas a
maior parte das ações pertence, de forma pulverizada, a investidores
domiciliados no Brasil e no exterior. Seria bom, talvez, o presidente do Senado
explicar a esses acionistas se eles podem torcer legitimamente por altos lucros
e gordos dividendos ou se deveriam, em atenção a seus interesses privados,
aplicar dinheiro em outra empresa.
O Brasil ganharia muito mais, e perderia muito menos, se o
senador Rodrigo Pacheco, seus companheiros e o presidente Bolsonaro cuidassem
menos do “papel social” da Petrobras e pensassem mais no "papel
social" do governo e do dinheiro público. Seriam muito mais comedidos ao
programar o Fundo Eleitoral. Nunca teriam criado o infame orçamento secreto,
uma forma de operar fora do controle dos pagadores de impostos e dos mais
legítimos credores das atenções do poder estatal. Não destinariam bilhões, por
meio de emendas, a interesses particulares, incluídos seus interesses
eleitorais, tão privados quanto os de qualquer investidor do mercado de ações,
porém às vezes menos legítimos.
Se pensassem mais no valor social do dinheiro público,
buscariam, diante do surto inflacionário, formas de ajuda aos mais necessitados,
por meio de programas bem desenhados e dirigidos a grupos bem definidos.
Evitariam desperdiçar recursos e nunca pensariam em violentar os padrões
federativos, interferindo na tributação estadual e na capacidade dos governos
de Estados e municípios de prestar os serviços devidos a seu público. Para
isso, no entanto, precisariam entender as obrigações, muito mais que as
prerrogativas, de quem ocupa cargos públicos em Brasília. Quantos iriam tão
longe?
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