A delegada e ex-secretária de Segurança Pública da Bahia, a vereadora Kátia Alves (DEM), é uma das figuras políticas que seguirão o prefeito ACM Neto (DEM), caso o democrata saia mesmo da legenda. Em entrevista ao Bocão News, a legisladora falou do seu histórico junto ao grupo carlista e teceu duras críticas às Delegacias Especiais de Atenção à Mulher (Deam), que em Salvador existe apenas duas, uma em Periperi e outra em Brotas para atender toda a capital.
Bocão News - A vereadora é um dos quadros tradicionais no grupo carlista. Com uma eventual saída do prefeito ACM Neto do DEM, vai seguir os passos dele ou vai avaliar seu futuro partidário?
Kátia Alves - O prefeito ACM Neto hoje é o líder do Democratas e eu pontuo como o maior líder político da Bahia. Então, para onde o meu líder for, como liderada, eu irei. Acho que como eu, tem muitos políticos, vereadores lá na Câmara que irão acompanhá-lo por acreditar no projeto que ele tem para Salvador, para a Bahia e para o Brasil.
BNews - Assim como o senador Aécio Neves (PSDB), a vereadora acredita que a saída do prefeito do DEM pode dar a ideia de uma oposição 'raquítica'?
KA - O prefeito é como uma estrela, onde estiver vai brilhar, pois tem competência para isso. Está sendo costurado, como ele falou, tem até setembro para tomar essa decisão e onde ele for, pode ter certeza que também irei. Faço parte desse grupo político desde a época do senador ACM e vou continuar ao lado dele. Eu acho que ao ser humano não pode faltar a coerência. Devemos sempre ser coerentes em nossas escolhas e nossas posições.
BNews - A vereadora integra na Câmara de Salvador a Comissão da Mulher e fez visitas às delegacias de atenção à mulher na capital. O que constatou?
KA - Eu fiquei muito triste em ver o retrocesso em se tratando de assistência à mulher vítima de violência aqui no nosso estado. Em Salvador, são duas delegacias e em ambas não tem plantões à noite e aos finais de semana. Estatisticamente nós ja sabemos, como autoridade policial que sou, mas também qualquer leigo que passar pelo tema vai ver que as ocorrências acontecem mais à noite quando o agressor chega em casa e nos finais de semana, quando muitas vezes está sob efeito de bebida alcoólica. O Estado, nesse momento, ele é omisso porque não oferece a essa vítima o atendimento que ela tanto precisa. Transferiu-se para o plantão metropolitano. Ora! O atendimento nas delegacias de proteção é diferenciado, a começar pela escuta. A pessoa que está lá, que vai ouvir o problema que vai ser relatado, ela tem que ter uma escuta diferenciada. Até porque não se trata de um marginal, se trata de uma pessoa que tem laços de afetividade com a vítima, uma pessoa que divide os problemas com ela, então, toda forma de atendimento e a condução do processo é diferenciada, até a legislação é específica. Na hora que o Estado se omite na prestação de serviço, só agrava o problema.
BNews - E diante desse cenário, o que poderia ser feito para contornar esse problema?
KA - Eu estou encaminhando um requerimento ao delegado geral da Polícia Civil, doutor Bernardino, solicitando a ele o retorno dos plantões 24 horas com a presença de uma autoridade policial nas delegacias especiais de atendimento à mulher e também, que através de portaria, ele amplie o atendimento ou abra esse atendimento para o grupo LGBT. Os gays, lésbicas, transsexuais e bissexuais para terem também esse atendimento nessas delegacias. Essa uma sugestão nossa. O que acontece com esse grupo? Às vezes, você é hostilizado pela sua opção sexual pelo vizinho. A pessoa ofendida sente receio de ir a uma delegacia e dizer que pela opção sexual está discriminado onde mora. A delegacia especial de atendimento à mulher, com essa escuta diferenciada tem também essa sensibilidade para atender também a esse público.
BNews - Há reclamações de que quando a vítima vai fazer uma ocorrência, quem geralmente atende é um homem, o que acabaria deixando a mulher vítima de violência desconfortável. Tem sido assim ainda?
KA - Infelizmente, isso acontece no dia-a-dia não só com mulheres, mas também com homossexuais. Há esse tratamento hostil, 'Ah! Você está com ele porque gosta, apanha porque gosta, você está aqui de novo, já esteve aqui'... Por isso a nossa preocupação em retornar como era na minha época que estive à frente da Secretaria de Segurança Pública. Mais da metade dos crimes registrados nas Deams refere-se à ameaças. O quê que compete ao Estado? Promover a reconciliação desse casal e a manutenção desse lar enquanto houver amor entre os dois. Então, você tem que interferir nessa relação com psicólogos, assistentes sociais, somente no final, com ocorrências mais graves é que é chamada à cena uma autoridade policial. Se a pessoa chega e é atendida com sensibilidade, chama o psicólogo, o assistente social, chama o agressor que está ameaçando ela para tentar resolver ali o problema. Acho que para o Estado, a manutenção do núcleo familiar é muito mais importante do que pegar alguém que fez uma ameaça e recolher ao xadrez. Muitas vezes é o pai do filho, alguém que mantém a casa, ou mesmo que não mantenha, mas que exista amor, afetividade e é essr vínculo que a delegacia vai tentar manter. Se você ameaçou, vai ser apresentado às penas que a Lei Maria da Penha prevê, isso pode fazer com que o agressor nem chegue às vias de fato, à agressão em si, fique apenas na ameaça. Ameaça é um crime de ação penal privada, muitas vezes a vítima chega lá, diz que foi ameaçada, mas não quer entrar com uma representação contra o companheiro, namorado ou marido, isso dificulta a formalização do procedimento. Muitas vezes fica lá engavetada. 'Eu estive aqui duas ou três vezes e não acontece nada', dizem isso. É que a mulher sobre forte emoção, ela chega à delegacia e diz uma coisa, depois de meia hora ela está ali repensando quais são as chances que ela vai dar ai seu companheiro. Nesse momento, quando entra o Estado através de psicólogo, assistentes sociais, chama o marido, para fazer uma terapia familiar ou individual, em grupo, tudo isso eu deixei pronto, funcionando na Deam. Hoje, sequer tem plantão, uma autoridade policial lá à noite ou nos finais de semana e feriados. A gente tem que apelar à sensibilidade do secretário de Segurança, do governador e do delegado para que se retome como era. Esse retrocesso é inaceitável.
BNews - Em sua experiência na área de segurança pública, por que ainda se tem muitos casos de agressões que se agravam após a mulher denunciar? O agressor passa a ter ódio por ter sido denunciado e a vítima continua vulnerável...
KA - As delegacias estão abarrotadas de ocorrências. Se você for registrar uma ocorrência na delegacia de Brotas, talvez sua audiência só vá ocorrer em outubro ou novembro. Estão faltando profissionais lá para atender a demanda. É humanamente impossível que uma delegada tenha que remeter 200 inquéritos por mês para a Justiça. É um problema de gestão que é preciso analisar onde estão os delegados que apenas fazem escalas de serviços, que só fazem ofício e porque não podem estar completando lá na atividade fim. Eu costumo dizer sempre que o delegado de polícia é a única autoridade constituída que a população tem acesso 24 horas. O juiz não tem, promotor não tem, defensor não tem. O Estado tem que fortalecer esse vínculo ali na delegacia de polícia com a comunidade onde essa delegacia está instalada. Na medida em ele presta um serviço, dando atenção, acolhimento, resolvendo os problemas principalmente de violência intra-familiar, a presença so Estado ali forte estabelece um vínculo de confiança da comunidade com o seu representante. A mulher chega, não encontra um delegado, em uma sexta-feira, só vai aparecer na segunda. Imagine o acúmulo de ocorrência da sexta à noite até segunda-feira, é muito complicado.
Postado por Bocão News em 30/06/2015.
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