*Por
Cristovam Buarque
Difícil
imaginar que João Goulart sofreria golpe militar, se seus apoiadores tivessem
percebido e reconhecido os próprios erros e assegurado apoio e confiança na
população. O golpe de 1964 foi consequência de forças diretamente golpistas
autoritárias, mas também da omissão e incompetência dos democratas.
Tanto
quanto as campanhas ideológicas dos golpistas, o golpe se apoiou no
descontentamento popular com a inflação, o desemprego, a instabilidade por
greves, as disputas internas na base de apoio; a incapacidade daqueles ao lado
do presidente para perceber os erros cometidos; a euforia de que tudo estava
bem e não havia o que temer, o mandato estava garantido e os militantes e
sindicalistas prontos para uma guerra nas ruas em defesa da Constituição e do
governo; e ainda a falta de percepção da força dos opositores, inclusive
externa, no tempo da Guerra Fria. A causa de golpes também é a incapacidade dos
governantes de reconhecerem a realidade.
Em
1964, o Brasil estava dividido entre esquerda e direita sem diálogo, cada lado
com seus interesses econômicos e ideológicos acima do interesse maior do
Brasil.
Cinquenta
anos depois, atravessamos um momento parecido: com vantagens, fim da Guerra
Fria e despolitização das forças armadas, e com desvantagens, raiva popular
diante da corrupção e sentimento de traição pós-eleitoral, além de que o
Fla-Flu partidário está menos preparado ideologicamente.
A
disputa entre governo e oposição outra vez impede um entendimento político em
favor do futuro do Brasil. Desta vez, felizmente, os golpistas são raros, mas
também são raros os que percebem os prejuízos na interrupção do mandato da
presidente e os que percebem os prejuízos que decorrerão da continuidade por
mais três anos e meio do governo sem credibilidade, com uma equipe frágil
politicamente e uma base dividida, unida por interesses menores por cargos.
Os
próximos meses estão entre as consequências arriscadas da interrupção do
mandato de um presidente (o segundo dos quatro eleitos diretamente depois da
redemocratização) ou as consequências previsíveis da continuidade do atual
governo. A única alternativa tranquilizadora para os próximos anos é uma
concertação negociada dos democratas comprometidos com: estabilidade política e
monetária, com crescimento econômico e com avanço social e respeito ecológico.
Ainda é
tempo de evitar a tragédia e o desastre, mas esta ideia parece ingenuidade
diante da nossa incapacidade como líderes nacionais. Neste momento, a culpa é
de todos nós, por não estarmos à altura do desafio histórico do momento. E se
não encontrarmos uma saída negociada, o povo na rua convocará por cima da
Constituição uma eleição geral antecipada, com impeachment de todos.
Se não
somos golpistas-por-ação, estamos golpistas-por-omissão, devido ao oportunismo
ou à incompetência, perdidos e em disputas sem o sentimento de interesse
nacional e de longo prazo.
Cristovam Buarque é professor emérito da UnB e
senador pelo PDT-DF
Assessoria de Imprensa
Sen
Cristovam Buarque (PDT-DF)
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