segunda-feira, 31 de outubro de 2011

“Acho que o Legislativo brasileiro ainda é muito subserviente ao Executivo”

Postado por Bocão News

Por: Luiz Fernando Lima
O sociólogo Rosemberg Pinto (PT) chegou à Assembleia Legislativa este ano e já é cotado como principal nome da base governista para assumir a presidência da Casa, após os três mandatos ininterruptos de Marcelo Nilo (PDT). Rosemberg traz na bagagem uma vasta experiência como gerente de comunicação da Petrobrás, além de 30 anos de militância no seu partido. O petista teve mais de 70 mil votos divididos em 300 municípios do estado. Nesta entrevista ao Bocão News, Rosemberg tece comentários acerca de criação do PSD, dos trabalhos no legislativo e da vida política do PT. O parlamentar defende posições polêmicas como o aumento de verba para a Assembleia e a diminuição de sessões plenárias. Para ele, é mais importante que os parlamentares se concentrem nos trabalhos das comissões temáticas ao dia a dia do plenário. Confira a entrevista na integra:

A Assembleia Legislativa há quatro semanas está com os trabalhos comprometidos. Muitos atribuem esta situação a dois fatores. O primeiro seria a necessidade de suplementação e eventuais desgastes com a base governista em decorrência de cortes nas verbas indenizatórias. O segundo seria provocado pela criação do PSD e as consequentes mudanças nas comissões temáticas. Gostaria que o senhor comentasse este momento do Legislativo baiano.

Eu acredito que esta paralisação das atividades da Assembleia se deu muito mais em função desta movimentação do PSD que de qualquer outra situação. Houve uma solicitação do PSD com relação a recomposição das comissões, o que é um legitimo direito do partido, para fazer isso são necessárias três sessões ordinárias. Já passamos duas, segunda (24) ou terça-feira (25) devemos ter resolvido isto. Com relação à despesa e receita da Assembleia, creio que seja uma questão menor. O ano passado quando foram verificar a situação financeira da Casa havia um déficit de R$ 51 milhões. O governo, em dezembro, entrou com a suplementação e fecharam o ano. Este ano o deputado Marcelo Nilo (PDT) – presidente da Assembleia – vendo chegar dezembro, colocou o ponto antecipadamente. Isto já se solucionou. Eu tinha a convicção de que o governo do estado iria honrar estes compromissos e vai honrar. Agora, isto também serve como uma experiência para que não deixemos acontecer nos próximos anos. Nós temos que trabalhar ajustados. Se o nosso orçamento é “x”, então nós temos que planejar para utilizar este valor. O governo está enviando a proposta de Orçamento para o próximo ano nos próximos dias e o relator terá que trabalhar para colocar nesta proposta algo que esteja dentro da nossa realidade do ano seguinte para não termos que ficar buscando o governo a todo instante.

O presidente Marcelo Nilo falou em cortes. Houve de fato redução ou bloqueio das verbas indenizatórias?

Até o mês de setembro foram honrados todos os compromissos da Assembleia. Ainda não terminamos outubro. Eu tenho a convicção de que até o final do mês todos os compromissos serão honrados e não vamos ter nenhum tipo de problemas com relação ao pagamento dos deputados.

O salário do deputado é de 20 mil reais, a verba de gabinete é de R$ 60 mil. Outros R$ 29 mil destinados a verba indenizatória e mais auxílio combustível. O custo/benefício para a sociedade na sua a opinião é justo?

Eu quero debater isto com a sociedade. Não tenho nenhum problema em dizer isto. Eu ganhava mais na Petrobras do que ganho como deputado. Acho que o salário é extremamente pequeno. Até porque não é R$ 20 mil. Este é o valor bruto, quando vai abater tudo, o deputado fica com R$ 12 mil. É um valor muito pequeno para o deputado com a responsabilidade que tem. Os R$ 60 mil é para custear as pessoas da Assembleia, não é para o deputado. O parlamentar tem a prerrogativa de indicar os assessores. Nós estamos num estado enorme. Eu, por exemplo, tive 70 mil votos. Fui votado em 300 municípios da Bahia. Preciso, portanto, manter pelo menos alguns assessores regionais. Como é que a Assembleia vai pagar isso? Eu não posso tirar isto do meu salário. Os R$ 29 mil de verbas indenizatórias servem para pagar toda a logística que um deputado tem. Quero lhe dizer que a Assembleia da Bahia é a terceira do Brasil com o menor custo. Nós gastamos menos que Sergipe e Pernambuco. Eu defendo que amplie a verba para a Assembleia.

O seu nome é ventilado como um possível candidato do governo à sucessão de Marcelo Nilo na presidência do Legislativo, depois voltamos a isto. Agora, gostaria de saber se lhe causa alguma estranheza o fato de nenhuma das contas da Assembleia terem sido julgadas no Tribunal de Contas do Estado (TCE) desde que Nilo assumiu o comando da Casa em 2007?

Não. Porque não é uma coisa específica da Assembleia Legislativa da Bahia. Existem em Câmaras de Vereadores situações semelhantes. Não é uma coisa que a gente possa colocar de forma negativa ou positiva. Para fechar esta outra coisa da Assembleia queria colocar o seguinte: eu sou contra a reeleição ininterrupta para presidência da Casa. Admito que possa ter uma reeleição na outra legislatura, porque não é considerado reeleição. Coloquei esta minha posição e talvez seja por isso que as pessoas colocam o meu nome como o de alguém que possa concorrer à presidência. Por esta minha defesa, que não é só minha, o deputado Álvaro Gomes (PCdoB) também defende este modelo. Eu proponho que isto valha após esta legislatura, até para evitar que pareça algo contra o deputado Marcelo Nilo. Tudo que tenho dito na impressa, tenho também conversado com ele. Eu defendo que aprovemos esta medida, valendo para 2015.

O senhor é posto como um dos possíveis candidatos porque transita bem dentro da base governista e também entre os deputados da oposição. Também tem uma participação efetiva dentro das políticas municipais. O PSD surge em um cenário no qual o PT trabalha com a possibilidade ter a sua maior vitória eleitoral em eleições municipais da história. Como é que o senhor avalia o PSD neste momento e o quê projeta para o futuro. O PT está ajudando a criar um monstro, que pode se virar contra a legenda no futuro?

Não trabalho com esta ideia. Eu penso que a criação deste novo partido já era esperada, não passando, portanto, pelas mãos do Partido dos Trabalhadores. O PT, aqui na Bahia, pelo fato do vice-governador Otto Alencar ser o presidente da nova legenda e estar alinhado com o governo do estado, apoiou esta caminhada com naturalidade. Otto Alencar tem dito em todos os momentos que este partido não fará, em 2012, oposição ao PT. Obviamente pode acontecer uma ou outra situação isolada que é próprio da vida política, mas a tese é de aliança. Agora, é lógico que o PSD nasce com uma musculatura muito grande e que poderá ser um adversário forte do PT lá na frente. Acredito que em 2012 e em 2014 será um dos parceiros prioritários. Sem dúvida alguma ele passa a ser uma ameaça ao PT lá na frente, porque neste momento há o governador Jaques Wagner e o vice Otto Alencar que consolidam esta união. Isto em 2015 ou 2016 certamente vai mudar, quando estes dois atores não estiverem à frente dos processos.

O PSD tirou muitos quadros de partidos da oposição ao PT. Um dos que mais perdeu nacionalmente foi o DEM. O objetivo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva era extirpar o antigo PFL. O plano tem dado certo?

Eu não sou daquele acho que se deve matar o adversário para sobreviver. Eu trabalho com a ideia de que o adversário está ali para contrapor a minha opinião e mostrar para a sociedade uma ideia diferente. Acho que o Lula até brincou quando fez aquela afirmação. Sei que a imprensa cobra esta posição de nós do PT. Na verdade, acredito que a sociedade é que vai dizer se o projeto será o do DEM, do PSD ou do PT. Penso que neste momento a sociedade vem consolidando a cada dia mais o projeto do PT.  Interessante que atualmente se fala muito em corrupção. O DEM aparece como o partido defensor desta suposta limpeza. Acontece que na última semana saiu o resultado de uma pesquisa com um ranking dos partidos que tiveram parlamentares cassados por corrupção e em primeiro lugar está o DEM e em segundo o PMDB. O PPS está na frente do PT, o PT é o décimo. Se analisarmos pela ótica da corrupção, o DEM está em primeiro lugar. Portanto, eles não têm nenhuma legitimidade para acusar o PT de nada.

Mas cada caso de corrupção deve ser visto individualmente. O senhor não concorda com isso?

Sim. Lógico.

Voltando para as atividades na Assembleia. O senhor é um defensor de que os deputados deveriam trabalhar mais nas comissões do que em plenário. A sociedade e a imprensa, de modo geral, costumam cobrar maior participação nas sessões. Gostaria que o senhor falasse um pouco mais sobre os trabalhos neste espaço do Legislativo?

O debate rico, na minha opinião, se encontra nas comissões. Eu defendo que não tenha sessão plenária nas segundas e nas quintas, e que a gente (deputados) priorize nestes dias os debates nas comissões. A prática já nos diz isso. Dificilmente nós votamos algo nestes dois dias. Geralmente, votamos nas terça e na quarta. Acho que é o momento de concentrarmos os debates nas comissões. Nelas temos a possibilidade, por exemplo, levar convidados para esclarecer situações. Nós não temos, a não ser em sessões especiais, a possibilidade de levar uma personalidade extra ao parlamento no plenário, mas nas comissões temos. Ai sim, nós teremos condições de dialogar mais profundamente com a sociedade. Se não fizermos na comissão um trabalho constante não estaremos dialogando com a sociedade.

O senhor acredita que os trabalhos nas comissões neste ano foram tão qualificados e intensos quanto o esperado?

Acho que nós caminhamos bastante. Quero parabenizar todas as comissões porque funcionamos bem. Óbvio que com problemas isolados em uma ou outra, mas de um modo geral foi tudo bem. Quero aqui frisar o trabalho da comissão de territorialidade que tem se debruçado sobre um problema antigo que é a regularização das fronteiras municipais. Porque sempre há divergências sobre isto. A comissão que eu presido que é a de Defesa do Consumidor também fez um bom trabalho. Levamos debates como banco, abate clandestino de carne bovina. Fizemos um debate importante sobre a Embasa, num momento em que se questionava o aumento da tarifa. Levamos o presidente da empresa para discutir e argumentar. Fizemos um debate público. Na minha opinião foi bom. Não foi acima da minha expectativa, mas esteve mais intenso do que as pessoas afirmam que era nos anos anteriores.

A Bahia se divide deputado?

Não se divide. A Bahia é plural, é enigmática. Ela tem esta diversidade pela sua forma de pensar e por esta diferença regional. Estes discursos levam a um debate extremamente superficial. Nós tivemos este debate sobre a divisão do sul da Bahia puxado pela Fernando Gomes no passado. Não teve sucesso e a sociedade rejeitou está situação. Agora, creio que não será diferente. Não vejo respaldo popular para isto.

Deputado, com a entrada do PSD a base governista cresce mais. O senhor falou há pouco da importância das oposições para o desenvolvimento da democracia. O que vemos por outro lado é que a Bahia caminha para ter uma unidade muito grande em torno do projeto do PT. O senhor acredita  que este movimento em direção ao governo pode atravancar os trabalhos parlamentares, no sentido de dificultar que as prerrogativas dos deputados, tais como fiscalizar o governo, sejam cumpridas?

Não penso a Assembleia Legislativa como oposição e governo. Ali, tem um grupo que se aglutina como maioria e outro como minoria. Até porque os 45 ou 46 deputados que estão unidos dentro de uma visão de apoio à chapa majoritária que governa a Bahia pensam diferente. Ocorre que o que faz a democracia é a independência dos poderes e a possibilidade de debater os projetos que chegam ao parlamento, independente de quem esteja assinando abaixo. Eu tenho um respeito muito grande pela oposição lá. Pelas pessoas que se intitulam oposição. São pessoas aguerridas e competentes e estão ali porque a sociedade entendeu que deveriam defender aqueles interesses. Por isso que eu acredito que a democracia vai se dar muito mais pela capacidade da Assembleia se organizar enquanto Poder independente do que pelo tamanho da bancada.

Mas esta relação não é direta? O senhor pode afirmar que atualmente a Assembleia é um Poder independente na Bahia?

Não é uma coisa da Bahia. Isto acontece em todo o país. Acho que o Legislativo brasileiro ainda é muito subserviente ao Executivo.

O senhor acredita que as leis como a que proíbe a aprovação de qualquer projeto que onere o Estado engessam os deputados?

Contribuí sim. Acho que deve haver limites, pois precisamos trabalhar com responsabilidade. Mas o deputado não poder apresentar projetos que provoquem qualquer ônus ao Estado é surrealismo. Primeiro porque o deputado fica ali apenas apresentando moções, títulos de cidadania e, em minha opinião, isto empobrece o papel da Assembleia Legislativa do Brasil. Acho que é necessário promovermos uma reforma política para atacar isto. O Poder Legislativo é muito subserviente ao Poder Executivo no Brasil. Não são deputados que são subservientes, o problema é estrutural. Eu sinto que há um movimento pela consolidação desta independência. Inclusive esta vinculação do proporcional ao Executivo leva a isso. Porque o deputado se elege vinculado a uma chapa majoritária. Com isso você acaba fidelizando está relação.

Fotos: Paulo Macedo // Bocão News|

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